O que Aconteceu com Você

Filhote, tem um montão de gente acompanhando nossa empreitada aqui! Mamãe ficou super feliz. É um pessoal muito querido, sabe, que sempre se preocupou com você desde pequenininho....

Bom, alguns até já estavam bastante bem informados à respeito de você, outros nem tanto. E nem foi porque a mamãe quis esconder suas complicações de todo mundo, não. É porque a gente mesmo, eu, seu pai, vovó e tal também fomos descobrindo e entendendo as coisas as poucos.

E hoje acho sinceramente que foi muito melhor assim. Existe um ditado ou uma frase sei lá que diz assim: "Santa ignorância". E no nosso caso foi mesmo melhor não saber tanto de tudo desde o início.

Imagina só sua mãe aqui despreparada, meio avoada, impaciente, que levou a gravidez nas costas, sem achar que nada era um bicho papão, de repente, leva o susto que você deu na gente e logo a seguir recebe um relatório médico falando de todos os detalhes e as possíveis e prováveis consequências da asfixia dos infernos?!

Não sei se eu teria aguentado, não sei se eu teria forças pra cuidar de você como acabei cuidando se soubesse de uma porção de coisas sérias que poderiam ter acontecido com você.

Sábios, o pessoal lá do hospital foi falando pra gente só o que eles achavam necessário. Até porque, pacotinho, tudo é incerteza nessa área neurológica.

Com o tempo, fomos nos adaptando, descobrindo, estudando e entendendo nas horas certas tudo o que precisávamos para cuidar de você da melhor maneira possível.

Resumindo, pra você e para nossos já fiéis seguidores, o que acontece é o seguinte: você teve uma asfixia no momento do parto. Asfixia é uma temporária falta de oxigenação no cérebro. Se o oxigênio não circula, o sangue tb não circula direito. O resultado é que onde não circula combustível direito, queima. Esse 'queima' chama-se esquemia. É como se essa parte que ficou ali sem ser irrigada, tivesse morrido.

Ninguém sabe direito quanto tempo você ficou asfixiado e consequentemente, não dava para saber o tamanho da lesão provocada. Só o tempo diria. Fomos instruídos então a ficar de olho no seu desenvolvimento, para desconfiar de qualquer possível sinal de sequela, atraso ou comportamento estranho.

Até os três meses, não houve nada de estranho. Você era e fazia tudo de acordo com um bebezinho da sua idade. Eu e seu pai já nem pensávamos nos fatídicos dias de UTI. Chegamos a achar que já havia passado tempo suficiente para podermos respirar aliviados. Afinal você ria, vocalizava pelos cotovelos, engordava à beça, mamava muito bem. Estava tudo certo.

Aí, a partir dos quatro meses, quando você deveria começar a pegar objetos e a ficar de bruços sustentanto o corpo com os bracinhos, você estava demorando a pegar no tranco. Foi então que a sua neuropediatra, Dra. Lais Pires, depois te falo mais dela, pediu uma ressonância. Por que não pediu antes? Essa também foi minha pergunta. Porque precisa de anestesia geral e não se deve correr o risco de uma anestesia geral, ainda mais num bebezinho, se não houver nenhum sinal que justifique o exame. E, olha, o dia do exame foi mesmo tenso. Voltei a ver você com um tubo no nariz e totalmente apagado. Todos os momentos da UTI voltaram à minha cabeça. Foi uma angústia horrível. Ainda mais porque não me deixaram entrar com você. De novo, passei 40 minutos que não desejo a nenhuma mãe.

Bom, o resultado da ressonância não foi surpresa. Confirmaram-se as suspeitas e você teve mesmo uma esquemia significativa na parte do cérebro responsável pelo sistema motor. Mas também tivemos uma notícia ótima, que apesar de também já se desconfiar, foi maravilhoso ter a confirmação: seu sistema cognitivo, intelectual, está totalmente preservado.

O que isso tudo quer dizer? Quer dizer que você terá mesmo bem mais dificuldade que os outros bebês para ganhar movimentos e sustentação. Mas se você e eu levarmos sua fisioterapia a sério, suas chances de chegar lá são imensas. Desde que você começou a malhação, já evoluiu muito. Hoje você já pega as coisas, do seu jeito, mas pega, já consegue se apoiar de bruços com os bracinhos e até já tem os movimentos das passadas.

O que dá pra concluir disso tudo, meu amor, é que sua lesão foi séria, mas seu quadro, sua recuperação estão bem elevados. E todos os médicos são unânimes em afirmar que o quadro da criança conta infinitamente mais que o exame. Há exames que mostram lesões mínimas e a criança fica com sequela mesmo assim. E há exames com lesões gravíssimas e a criança consegue se recuperar totalmente. Ou seja, o exame é um dado, mas o que importa mesmo é a sua resposta ao tratamento. E que tratamento! Você atualmente faz fisioterapia duas vezes por semana, terapia ocupacional (uma fisioterapia com brincadeiras) uma vez, fonoaudiologia uma vez também e equoterapia (a do cavalinho) mais uma vez. E a natação está na fila, só esperando o frio ir embora. Fora o que eu, seu pai e sua avó fazemos com você em casa. Não deixamos você quieto um minuto. Bobeou, tá fazendo exercício. Isso tudo será muito importante, principalmente, até você fazer 2 aninhos. É quando seu cérebro termina de se formar e espera-se até lá que ele tenha encontrado outro caminho para fazer o que a parte queimada está obstruindo. Vamos torcer!

Entendeu tudo direitinho, cenourinha? Se Deus quiser, quando você for ler isso, já vai ser triatleta.

um beijo na ponta do nariz
sua mãe