Atenção!

"(...) apesar de ter mergulhado de cabeça nesse misterioso mundo das lesões neurológicas e suas possíveis consequências, não sou médica. Tudo o que coloco aqui são impressões e experiências pessoais. (...) Enfim, não sou uma profissional da saúde, apenas uma mãe muito, muito, muito esforçada em início de carreira".



segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Os Outros

Um dos principais motivos da mamãe ter criado esse blog, pacotinho, foi para que as outras pessoas se sentissem mais confortáveis para perguntar sobre você. Desde que mamãe entendeu que você era uma criança que precisaria de mais cuidados que o normal, uma onda de pânico tomou conta de mim não só por estar diante de uma situação que eu não estava preparada - ninguém está -, mas por temer que os outros sentissem pena de você.

Então, antes de me deparar com expressões constrangidas, sorrisos amarelos e olhares de 'tadinho', rapidamente criei uma forma de deixar tudo muito claro para que quem quisesse entedesse exatamente pelo que estamos passando e não ficasse melindrado na hora de abordar o assunto. Isso mesmo, eu, que sou uma porta fechada, decidi fazer de nós um livro aberto em prol de um clima positivo a sua volta.

E tem funcionado. Ainda bem, minha estratégia tem sido totalmente bem sucedida. Assim, evitamos que nos tratem de forma diferente e barramos aqueles horríveis olhares distantes e sucessivos cochichos que só quem faz acha que ninguém percebe.

Bom, por que mamãe está falando isso? Porque mesmo assim, com todo esse cuidado que fiz questão de ter, volta e meia ainda me preocupo com o que os outros vão pensar de você. Só que como você tem essa cara de modelo mirim da Richards, quase nunca somos fuzilados com algum olhar preconceituoso, de pesar ou de curiosidade. Mas a partir do momento em que entramos nesse vasto mundo que é o das crianças especiais, acabo me refletindo e me solidarizando com outras mães que vivem situações parecidas com a nossa.

O problema, e eu já disse isso inclusive para uma mãe amiga, é que nem sempre o problema são os outros, mesmo que eles possam sim ser desagradáveis, insensíveis ou meramente inconvenientes. Muitas vezes, diria que na maioria, o impasse, a falta de tato, o 'piorar' da situação começa com a gente mesmo. Automaticamente, sem querer, acabamos vestindo o manto de vítimas e nos afastamos com desculpas do tipo: é difícil explicar o quadro, quem não passou por isso não tem como entender etc.

Também não é fácil admitir que essa distância inconsciente seja justificada pelo simples motivo de que é muito difícil ver como a vida do vizinho é 'simples', como o filho dele é 'normal'. Não queremos assumir, aliás, não queremos permitir que uma invejazinha, mesmo que explicável, se instale em nossos próprios olhares e pensamentos. Às vezes, muito antes dos outros nos olharem com pena, somos nós quem olhamos com cobiça. E por mais que nosso amor pelos nossos queridos filhos não mude um centímetro, é impossível não pensar como seria se também fôssemos uma daquelas mães ali ao lado.

Onde quero chegar com isso tudo? Sei lá. Não tenho muito uma conclusão porque não é algo por que se passa em um determinado momento e depois acaba. Não. Sempre estaremos suscetíveis a nos deparar com esses sentimentos ao olharmos em volta ou ao sermos olhadas.

Mas com o tempo melhora. Acho que é aí que eu quero chegar. Como em qualquer outra situação difícil da vida, você se acostuma. Disse isso pro seu vovô, pai da mamãe, outro dia: depois de um tempo, depois do susto com o furacão, você acaba aceitando e entendendo que aquilo é a sua nova realidade. E quando eu entendi que a minha vida agora era essa, passei a vivê-la da melhor forma possível. Eu tentava explicar ao vovô que não é só porque estamos vivendo um dia a dia de mamãe e bebê um pouco mais hardcore que o normal, que teremos, que eu terei, que ser tratada diferente, que devem tomar cuidado comigo, que evitem me contar ou me fazer participar dos demais problemas dos que estão a nossa volta. Claro que contamos com o bom senso da turma de, já que estão tão perto de nós, também dêem uma repensada no que é realmente um problema. Acho que assim como essa experiência toda tem sido enriquecedora e cheia de ensinamentos pra nós, também pode e deve ser para os que nos cercam.

E é isso aí, filhote, a melhor forma que a mamãe encontrou de lidarmos com isso tudo é essa: dividir com os outros as coisas boas e ruins que acontecem conosco. Falar sempre sobre você sem esconder nada, sem querer te preservar de nada. E é, acima de tudo, mostrar o quanto eu e você somos fortes, para que também nos passem força. E se, de vez em quando, mamãe der uma pequena suspirada ao ver um bebê da sua idade engatinhando freneticamente pelo chão como se isso fosse a coisa mais simples do mundo, me dê um desconto, certo? E, como eu falei outro dia, deixe que a gente até faça piada de nós mesmos, meu pequeno mamulengo...

Não é raro mamãe brincar com a nossa realidade nua e crua justamente porque ela não precisa ser cruel. E isso depende muito mais da gente do que dos outros.

3 comentários:

  1. Dri, olhar para a grama do vizinho e achar que ela é muito mais verde que a sua faz parte da vida, é absolutamente natural e todos, sem exceçao, passam por esses momentos na vida, em tantas outras questoes. Mas o mais bacana disso tudo é poder olhar pro lado, assumir que vc adoraria que sua realidade fosse outra, mas saber vive-la bem, de forma positiva, como vcs 3 tem feito. Vc é um exemplo de como a vida pode ser muito boa, apesar das armadilhas que ela apronta. Continue por esse caminho, que ele vai chegar em um lugar muito bom la na frente. Conta com a gente sempre. Um beijo bem grande, dos amigos orgulhosos de vcs, Paulette e Jander.

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  2. Grande mãe! Que beleza de atitude, de texto e de composição! Essa deu para molhar -e bem- os olhos. Os russos costumam dizer que um homem é bom quando faz melhores os outros. Sua vida está um verdadeiro exemplo. Exemplo beneficiando muitos, e entrando como semente, a germinar adiante, no espírito dos que agora não têm sensibilidade para apreciar, e por isso podem maldar alguma coisa. Mas, por imaturidade, porque essencialmente as pessoas não são más, embora possam estar assim. Mais à frente, quando as dores naturais da vida fizerem aflorar o alcance, seus corações poderão processar seu exemplo, e em reconhecimento e gratidão farão chegar a você o retorno do que está plantando. Bravo! Bs do tio Dedé.

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  3. Ai Adriana, este texto me tocou profundamente. Deu um nó no meu coração e apertou minha garganta. Vc expôs a realidade nua e crua com uma sinceridade incomum. Muito nobre da sua parte.Queria falar mais coisas mas não consigo, miha garganta ainda está apertada e isso nem me deixa pensar.Quem sabe um dia eu consiga organizar minhas idéias e poder te falar

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