Oi filho... desculpa mamãe ter demorado de novo para aparecer, mas é que fomos assombrados por um de nossos piores fantasmas: as convulsões. Sim, vou começar entrando de sola porque, após um período de temor congelante, decidi encarar a coisa sem mais, nem menos importância do que ela realmente tem. Mas achei válido vir aqui contar, primeiro como registro se algum dia quisermos ter acesso a essa informação com data e detalhes, depois porque o propósito não é compartilhar, dividir?
Tá certo que virei uma das maiores defensoras de se olhar sempre o lado positivo de tudo, mas acho que nossa história não seria mostrada de maneira fiel se parecesse aqui que vivemos num mar de rosas. Mas, olha, na maior parte do tempo, somos muito felizes. Que fique o registro.
Pois bem, na verdade a coisa nos deu um baita susto e nos pegou de surpresa mais ou menos uma semana antes de viajarmos. Do nada, um dia após dormir com o papai como sempre faz, você deu tilt. Pra mim, a coisa foi assim: cheguei no quarto para ver se estava tudo bem - também como sempre faço - e seu pai estava um pouco estranho, te chamando baixinho. Cheguei perto e imediatamente vi que algo estava fora da ordem. Descrevendo, você estava de olho aberto, mas com o olhar totalmente parado e para cima. Não respondia a nenhum chamado e só fazia um som de uma espécie de respiração arrastada. Eu tentava fazer contato visual com você, mas suas duas pupilas estavam voltadas para o alto e para o mesmo lado. Enquanto mandei seu pai ligar para a tia Laís, corri com você para o chuveiro de água fria de roupa e tudo. Foi minha primeira reação porque é o que eu sempre ouvi que os meus pais fizeram comigo quando eu tive uma convulsão febril. Só que não adiantaou. Você nem piscava. Papai já estava com a tia Laís no telefone e ela nos orientou, na falta do supositório de Diazepan, a te dar 3 gotas de Rivotril. Demos. Nada. Ela ainda no telefone, achou que era melhor irmos para o hospital.
E assim conhecemos o Rio's D'or, nosso substituto do Copa D'or devido a nossa nova morada. Eu fiquei na recepção na burocracia com Marina no colo - sim, Marininha foi junto na caravana - e papai entrou correndo com você. Quando eu cheguei, você já estava de olhinhos fechados, parecendo chapado e dopado pelo Rivotril. Aí, aquela história chata de sempre, da dificuldade de achar um acesso nas suas pequenas veias, a luta cruel do exame de sangue e mais uns exames clínicos até decidirem só te deixar umas horas em observação para ver se acordava e como seria. Não foi preciso tomar mais medicações e, após um tempinho, você passou a se mexer e a dar umas reclamadas, mas não abria o olho e nem nos dava o que queríamos: um sinal de que você era você mesmo de novo.
Fomos pra casa com você dormindo e só no dia seguinte depois deu e seu pai fazermos serão esperando você acordar que tivemos a grata alegria de te ver sorrindo e nos reconhecendo normalmente.
Ufa. Só isso que eu te falo.
Enfim, depois seguiram-se teorias, fizemos um eletro de urgência e não se chegou a muitas conclusões. O eletro estava até melhor que o último e, como você teve uma febrinha no dia seguinte e ficou com mais uma virose respiratória, ficamos com a hipótese de que foi por causa desse quadro viral que por algum motivo furou suas barreiras que já não são lá muito fortes.
Mas foi uma tremenda mancha num cenário de 1 ano e meio de crises controladas. Balde de água fria, sensação ruim... Um saco.
Mas como estávamos na boca da viagem, a coisa foi meio deixada de lado como se tivesse sido um acidente indigesto de percurso. Meio que colocamos uma pedra no assunto até para conseguirmos viajar sem paranóias.
E funcionou! Como já falei, a viagem foi ótima e você ficou super bem.
Graças a Deus. É o que digo agora. É que no domingo passado, o episódio se repetiu. Não foi tão punk, até porque não era mais desconhecido, mas foi outro balde, como que nos dizendo que não é algo que podemos dar tão pouca importância assim. Mas o graças a Deus foi por você não ter feito nada lá. Ia ser bem tenso.
Como percebemos logo de cara que algo estava começando a ficar esquisito e tínhamos o supositório desta vez! - comprei lá na viagem - a coisa foi bem mais rápida e menos assustadora. Ligamos sim para a tia Laís, mas mais para um apoio moral. Fizemos o que tinha que ser feito e você voltou logo, apesar de bastante irritado.
No dia seguinte, mais uma vez estava ótimo, como se nada tivesse acontecido.
Ah sim, outra vez você está com virose, secreção etc, etc, etc. Então, continuamos achando que a relação procede.
Mas vou te falar, não queria conviver, nem esporadicamente, com essas malditas convulsões. Oh coisa ruim... É tão ruim te ver diferente, filho... como se estivesse ausente, em outro planeta. Meu coração fica tão apertado...
E é isso. Passei esses dias um pouco mais fragilizada e me concentrando para não cair em paranóia, nem me deixar abater muito. Ainda vou checar toda hora, depois que você dorme se está tudo bem - nas duas vezes a coisa aconteceu quando você estava dormindo - mas conversei muito com a tia Laís e decidimos não fazer disso um bicho de sete cabeças.
Para todos os efeitos, ela está lidando com a coisa como eventos isolados e esporádicos, dentro de cenários que facilitam uma queda de limiar convulsivo e que não te prejudicam em termos de desenvolvimeto. Vamos observar. Acabamos assim o nosso papo.
Ou seja, rezo toda noite para que esse fantasma não nos visite mais. Mas, caso visite, não vou entrar em desespero.
Termino hoje com um pensamento de solidariedade a todas as mães que já passaram, passam ou vão passar por isso. Decididamente é algo que ninguém deveria passar. Uma das maiores angustias que se pode sentir.
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Esse sim é meu Antonio! Serelepe sempre. |